domingo, 16 de maio de 2010

Futebol e Multidões...

Os dois conceitos interligam-se na perfeição, mas não é bem a minha intenção ligá-los agora e aqui.
São somente pretexto para reflectir um pouco sobre fenómenos sociais e históricos (?) que nos acompanharam nas últimas semanas.
Assim, começando pelo caso do futebol, a recente vitória do Benfica provocou nos adeptos reacções de enorme alegria, a que a comunicação social deu relevo. Fosse em Lisboa ou no Porto (aqui com menor liberdade), ou em qualquer outro espaço de Portugal, benfiquista que se preze lá foi exprimindo ruidosamente o seu grande contentamento. Até aqui tudo normal e esperado... Menos esperado foi verificar a mesma felicidade em... Angola, Cabo Verde, Moçambique! Assistimos pelos telejornais aos naturais das nossas ex-colónias a gritar pelo "seu" Benfica nas ruas e avenidas. Contou-me uma amiga que, de férias em S. Tomé, presenciou os santomenses a seguirem apaixonadamente o relato dos jogos do campeonato português, em pequenos rádios colados ao ouvido... Hoje mesmo, os jornais dão conta da visita de uma comitiva do Benfica a Timor Leste, a convite de Xanana Gusmão, ele próprio adepto deste clube, e do grande amor dos timorenses pelo Benfica (e, eventualmente, por outros clubes lusos).
Realmente, razão tinha Salazar quando se referia à singularidade do colonialismo português! Claro que o argumento se prendia com a necessidade de justificar a manutenção de uma política colonial, enquanto as nações democráticas, lá fora, iam abdicando das suas colónias. Mas, lá que o fenómeno é extraordinariamente interessante... não o podemos negar. As ex-colónias africanas, com mais de três décadas de independência, mantém com a ex-metrópole laços apertados em forma de "bola". Dá muito que pensar!
Agora as multidões: O mesmo triunfo do Benfica fez explodir multidões por todo o lado; dias antes, a comemoração dos 36 anos da Revolução dos Cravos foi pretexto para recordarmos a multidão de portugueses nas ruas em 1974, particularmente no primeiro 1º de Maio em Liberdade ( como o profº Zé António referiu no seu post); a recente visita do papa Bento XVI a Portugal envolveu e fez sair à rua milhares e milhares de portugueses... Tenho reflectido, dado estas coincidências, sobre estes fenómenos de massas. Mas outro "efeito-multidão" se me apresentou de forma muito interessante na última sexta-feira, quando, com uns alunos do 12ºF, assisti ao filme/documentário Fantasia Lusitana, de João Canijo. As imagens de época testemunham as multidões que apoiavam Salazar, por exemplo, no Terreiro do Paço; ou que visitaram a exposição do Mundo Português; ou que assistiram à missa de inauguração e consagração do Cristo Rei, em Almada.
Temos aqui presentes vários tempos históricos da nossa contemporaneidade; temos também vários áreas, como a política, a religião, o desporto. Mas... e as multidões? Será abusivo pensar que as massas que apoiaram fervorosa e apaixonadamente Salazar e o Cardeal Cerejeira em 40, podem ter estado nas ruas em 58, junto de Humberto Delgado, e no Largo do Carmo em 74? E as massas que gritaram as palavras de ordem mais esquerdistas no 1º de Maio de 74, será que podem ter acompanhado esta semana o Santo Padre?
Resta-me a coerência dos adeptos do Benfica!

Luísa Godinho

2 comentários:

  1. Está muito polémico Luísa!

    As "massa populares" desempenham sempre um determinado papel! Normalmente não estão ao serviço de si próprias, ou seja, das pessoas individualmente consideradas...O ser humano tem esta tendência, pouco inteligente, de se deixar manipular. Mas há de tudo: os que vão ao foot pela excitação de se integrarem numa "clac", "dar porrada" e apanhar bebedeiras, há os que vão pelo espectáculo do "desporto rei" e são verdadeiramente honestos e inteligentes nas apreciações( técnicas, estéticas...) sobre o jogo, há os que vão pelo club, gritam imenso e não chegam a admirar o jogo...Também havia os defensores do Salazarismo, "do Sr. Presidente do C.", mas outros eram arrebanhados, enfiados nos autocarros organizados pelos governadores civis e aproveitavam para visitar a família em Lisboa e conhecer o Terreiro do Paço. Num Portugal atrasado e sem arranha-céus é natural que tenha sido inesquecível para milhares de portugueses a inauguração do "mamarracho" do Cristo-Rei. Quanto ao Papa na actualidade, lamento, mas...já não comento...aderi à associação ateísta...já não posso com santos e milagres!( são vestígios do passado,respeito quem os segue, mas não tenho paciências para essas ideias) A propósito fui na última 6a feira a uma conferência sobre Deus e Ciência, onde foi realizada uma exposição belíssima sobre o método científico, os avanços nesta área durante os séculos XIX, XX e XXI e se debateu sobre a existência ou não de Deus.
    Muitas são as formas de manipulação, pensadas, calculadas, organizadas( também na actualidade e em todos os regimes) e é sabido que algumas pessoas são muito influenciadas pelo contexto histórico e mudam de posição, conforme os ventos correm...o que acontece com frequência é a falta de sentido crítico e portanto a dificuldade de em cada momento cada um decidir o seu caminho independente do rebanho...O filme que referes levanta exactamente a questão da indiferença de tanta gente ( os portugueses guiados pelo ditador) permanentemente em festa... a guerra mesmo ali...a capital(Lisboa) cheia de judeus refugiados, perseguidos pelo nazismo, mas as marchas populares guiavam o nosso destino dito neutro.
    Tenho sempre uma desconfiança em relação às multidões, até posso lá estar ( às vezes) mas adopto procedimentos cautelosos. Mesmo assim prefiro os debates em reuniões mais pequenas.
    Isabel Isidoro

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  2. As multidões... Lembram-me as nossas bem recentes campanhas eleitorais.... Autocarros (previamente organizados) cheios de gente vindos de todos os cantos do país para apoiar... a maior parte das vezes não sabem quem.....
    Isabel Pinto

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