segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Situada mesmo em frente da Igreja Matriz de Oeiras, a rua Febus Moniz é uma das ruas mais antigas de Oeiras, senão a mais antiga. Para quem sai da Igreja, é, talvez, o caminho mais curto para chegar aos antigos aposentos do Conde de Oeiras, o que prova a importância que teve noutros tempos, antes de existir a rua principal da vila, a rua Cândido dos Reis. O nome Febus Moniz revela um sentimento anti-castelhano das gentes de Oeiras. Para mim, os nomes das ruas e das avenidas devem ser uma espécie de engramas colectivos, registos da nossa memória histórica. Curiosamente, está na moda, hoje, atribuir nomes de flores, de árvores, como por exemplo, a rua das rosas, dos goivos, das tulipas, etc., enfim, termos mais ou menos assépticos, que denunciam a desmemorização histórica da pós-modernidade, em que vivemos. Quem atribuiu o nome de Febus Moniz a essa rua exígua, mas que outrora teria sido a maior e a mais importante rua de Oeiras, quis, muito provavelmente, homenagear esse grande português e, sobretudo, manter viva a identidade de Portugal e honrar o corajoso povo de Lisboa, num período em que as classes nobres se acobardaram e muitos atraiçoaram a memória dos seus antepassados.

Quem foi afinal Febus Moniz? Febus Moniz nasceu em 1515 e foi um fidalgo muito estimado na corte de D. Catarina e de D. Sebastião. Desempenhou vários cargos no Paço, dos quais se destacou, em 1580, a eleição para Procurador às Cortes de Almeirim. Em Almeirim, marcou, com a sua presença, a força do espírito português da independência do reino. Descendente de família ilustre, cavaleiro da Ordem de Cristo e camareiro de El-Rei, desempenhava o cargo de presidente da Assembleias dos deputados da Vila e Cidades, quando das terras marroquinas de Alcácer Quibir, veio a notícia do desaparecimento do jovem Rei D. Sebastião, que, com o seu exército, tinha sido derrotado pela força inimiga, no dia 4 de Agosto de 1578.

Em 11 de Janeiro de 1580, reúnem-se as Cortes para discutir a eleição do Rei português, que deveria substituir o Cardeal-Rei D. Henrique, já velho e doente.

Já durante as reuniões preparatórias e nas assembleias, Febus Moniz terá produzido várias intervenções, com grande carga emotiva. Nestes actos e nas Cortes, e apesar dos seus 64 anos, defendeu sempre a causa da independência nacional, com grande patriotismo. Representando o povo, pediu que entregassem o reino a um governante português, ao que se opuseram os membros do clero e da nobreza.

De entre os procuradores das várias cidades do reino, foi dos que melhor defendeu a causa da independência portuguesa, proclamando a vergonha de se aceitar um rei estrangeiro. Assim, perante as Cortes, Febus Moniz agiu como procurador do povo de Lisboa, fazendo ouvir a sua voz exaltada por um sentimento patriótico, mas de tom firme, autoritário e seguro, apesar da sua idade já avançada. Disse, de olhos nos olhos, ao Cardeal-Rei:

”Que Vossa Alteza oiça o povo e se tiver direito a eleger, eleja rei português, porque, sendo castelhano não será recebido nem obedecido”.

Quando o medroso Cardeal D. Henrique reconheceu ao soberano espanhol o direito do trono português, Febus Moniz ficou desesperado por ver que o país iria cair nas mãos de um monarca estrangeiro.

Após a dissolução das Cortes, Febus Moniz retirou-se para Santarém, afastando-se de uma causa já irremediavelmente perdida.

Quando Filipe II subiu ao poder, ordenou a prisão de Febus Moniz (e de todos aqueles que se lhe tinham oposto), vindo este a morrer, no cárcere, poucos dias depois, no ano de 1580.

José António, prof. de Filosofia da ESQM

2 comentários:

  1. O post do professor Zé António, remete para uma questão que acho deveras interessante: a toponímia.
    Toponímia significa «nome de um lugar» e provém dos vocábulos gregos tópos (lugar) e ónoma (nome).
    O nome dos locais (ruas, becos,largos, avenidas...)está frequentemente ligado à História nacional ou local e é memória de factos ou personalidades, bem como da cultura local.
    Para além do exemplo da Rua Febus Moniz, outros topónimos da vila de Oeiras revelam essa realidade. Vejamos alguns: Largo Marquês de Pombal, Rua D. José I, Rua 7 de Junho de 1759 (data da elevação de Oeiras a vila), Largo Avião Lusitânia (hidro-avião com que foi feita a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, Lisboa-Rio de Janeiro).
    Também se quis memoriar a vivência rural oeirense com a Rua Caminho da Quinta ou a Rua Lagares da Quinta ou o Caminho Velho da Carreira das Vinhas.
    A especificidade cultural não foi esquecida com a Rua da Biblioteca Operária Oeirense ou a Rua Coro de Santo Amaro de Oeiras.
    Espero ter despertado a curiosidade para esta matéria da toponímia. Qual é o nome da tua rua? Conheces a personagem ou o facto nela evocado?
    Se não sabes, pesquisa e descobre o que/quem se pretendeu memoriar.

    Ainda a propósito da toponímia, gostava de aqui deixar um excerto do poema «Terra Fria IV» do David do 11ºE. Reza assim:

    [...]
    Oh! Futuro... Coisa vil e mesquinha...
    Tenho saudades de ser mais pequenino,
    não maior que os arbustos
    ao fundo da rua vazia.

    Céus! Nem essa rua hoje está vazia!
    E passou a ter nome!
    Também tenho saudade de não ver placas toponímicas
    e de as ruas terem os nomes
    que as gentes que lá passavam lhes davam.
    (David Silva)

    Luísa Godinho

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  2. Gostaria de clarificar a referência que fiz no comentário anterior ao Largo Avião Lusitânia: este foi o primeiro de três aviões envolvidos na travessia Lisboa-Rio de Janeiro. Era um F400 que ficou nos Penedos de S. Pedro e S. Paulo (no centro do Atlântico, frente a Fernando Noronha, Brasil) e foi substituído por um F16 (Sta Maria) e este, mais tarde, por um F17 (Sta Cruz). A travessia foi, pois, levada a cabo por um conjunto de três aviões e num total de 60 horas de voo e 4.367 milhas (7.027,81 kms) de distância.
    Luisa Godinho

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