Quanto a D. Francisco de Távora, o segundo condenado masculino, era esposo de D. Leonor, cunhado do Duque de Aveiro, e fora, em 1750, nomeado Vice-Rei da Índia, em substituição do seu pai Marquês de Alorna. Acompanhou-o nesta empresa militar a sua esposa D. Leonor e o seu filho primogénito D. Luís Bernardo de Távora, que, por graça especial de El-Rei, já usava o título de Marquês. A esposa de D. Luís de Távora, D. Maria Teresa de Távora, geralmente conhecida como a marquesa nova, era uma mulher um pouco fútil, mas tão formosa como D. Leonor, sua sogra. Ora, por fortuito acaso ou não, a jovem esposa não acompanhara o marido e os sogros nesta empresa militar e, neste período em que o marido esteve ausente, D. Maria Teresa frequentava regularmente a corte e, talvez, por esse facto, D. Maria Teresa de Távora tornou-se íntima de Sua Majestade El-Rei D. José. A verdade é que os Távoras partiram para a Índia ainda no reinado de D.João V e fora o próprio D. José, príncipe herdeiro, que os acompanhara ao cais de embarque para se despedir de tão ilustre família, a mais rica, a mais poderosa, a mais ilustre e a mais nobre de Portugal. No entanto, aquando do regresso da família Távora, conta-se que D. Francisco de Assis ficara muito melindrado porque El-Rei não teria ido esperá-lo ao cais, uma vez que prestara tantos e preciosos serviços ao Reino de Portugal e à Coroa, durante a sua campanha em terras do oriente. Ou por ter sido preterido pelo Rei, ou pelo agravo que o monarca fizera à família Távora pelo concubinato entre o Rei e a jovem Duquesa nova, ou pela sobranceria em relação ao Primeiro-Ministro Carvalho e Mello, ou ainda por todas estas razões, o facto é que as relações entre os Távoras e a Coroa acabaram por se deteriorar, dando azo a diversas especulações e aos mais inimagináveis boatos. Assim, estava criado o clima propício de implicação dos Távoras na conjura. De tal forma que, no dia 13 de Janeiro, os Távoras foram acusados de alta traição, não havendo, no entanto, nenhum facto comprovativo do seu envolvimento no atentado, a não ser a confissão do orgulhoso e insensato Duque de Aveiro, que, mediante a tortura do fogo, da água a ferver, envolveria a prestigiada família no atentado. Para além destes nobres, os dois sicários, António Alvares Ferreira e José Policarpo de Azevedo, que dispararam os bacamartes sobre a sege real, supostamente a mando do Duque, foram também sentenciados. Assim, ordenou a Suprema Junta de Inconfidência que D. José de Mascarenhas, Duque de Aveiro, acusado de ter sido o cabecilha do atentado real, sofresse o seguinte suplício: “ (…) com um baraço e pregão seja levado à Praça do Cais, em Belém e num alto cadafalso seja castigado e visto pelo povo e seja exposto em roda para satisfação dos presentes e futuros vassalos deste reino, que depois de ser ter quebrado os oitos ossos das pernas e dos braços seja queimado vivo e que o seu corpo seja reduzido a pó e a cinzas e sejam estas lançadas ao mar para que dele não haja qualquer memória futura”. Para apagar ainda mais a memória do Duque, a Suprema Junta ordenou que fossem picados todas os escudos, brasões e insígnias da casa ducal e todos os edifícios, e que casas e casebres pertencentes ao Duque e dos seus familiares fossem demolidos e arrasados e que os campos fossem salgados para que não fosse possível cultivar qualquer palmo de terra e ainda que todos os haveres incluindo jóias, ouros e pratas e mobiliário fossem confiscados e que fossem integrados nos bens da Coroa. Assim, para executar a referida pena, uns dias antes do famigerado 13 de Janeiro, algumas dezenas de carpinteiros começaram a construir o cadafalso em Belém e o povo, nesse dia, de triste memória, apressou-se para presenciar o macabro espectáculo, tal como era costume desde o tempo do não menos cruel e fanático D. João III. Assim, dezenas de faluas ancoraram em Belém, carregadas de espectadores vindos das zonas ribeirinhas do Tejo. Curiosamente, este mesmo povo, uns anos mais tarde, regozijar-se-ia, de alívio, com a exoneração do Marquês de Pombal e clamaria por justiça à piedosa soberana D. Maria I, desejando ver Sebastião de Carvalho e Mello sentenciado da mesma forma que os infortunados conjurados. D. Francisco de Távora e o seu filho primogénito, D. Luís Bernardo de Távora, foram condenados aos mesmos suplícios infligidos ao Duque de Aveiro. Estes dois últimos desgraçados, ao que parece, nunca estiveram implicados na conjura, pois, na verdade, D. Maria I, logo que subiu ao trono, acabou por reabilitar a memória da família Távora, o que nunca veio acontecer com a memória do Duque de Aveiro. Os autos de condenação da ré D. Leonor de Távora, mulher do réu D. Francisco de Távora, rezavam o seguinte: “que seja somente a cabeça separada do corpo e depois queimada e as suas cinzas lançadas ao mar”. Não deixa de ser quase irónico a palavra somente, como se os juízes procurassem revelar alguma piedade. Nesse dia 13 de Janeiro de 1759, D. Leonor subiu ao patíbulo ladeada por dois frades que a entregaram ao carrasco perito exercitado na Inquisição, depois da confissão que durou cerca de duas horas, para quase desespero de todos lúgubres espectadores, onde se incluía, para além de muito povo, toda a Corte, o próprio D. José e o seu orgulhoso Primeiro-Ministro. Enquanto D. Leonor subia ao cadafalso de forma digna sem perder a serenidade e a nobre altivez, um dos carrascos ia explicando detalhadamente os suplícios que iria sofrer bem como os suplícios dos seu familiares e as razões de tais suplícios. Quando o carrasco lhe vendou os olhos e afastou o lenço do pescoço, a Duquesa na sua voz autoritária, própria da sua linhagem, virou-se para o verdugo e pronunciou as últimas palavras: “Não me descomponhas!” e, apenas, de um golpe, o carrasco deixava, assim, cair o cutelo, ao mesmo tempo que gritava “Justiça que manda fazer El-Rei” e, imediatamente, pegando na cabeça ensanguentada, já separada do corpo, daquela que fora a mulher mais formosa e inteligente da corte de D. João V, elevava-a bem alto, para que todos os presentes a pudessem ver. Perante aquele macabro espectáculo, a nobreza, apesar de já habituada aos autos de fé, estava apavorada. No fundo, os condenados pertenciam à nobreza. Mas, por insistência da Rainha, foi possível poupar as mulheres e as crianças à matança. Foram, no entanto, imediatamente encarceradas em conventos, para nunca mais de lá sair a não ser muitos anos mais tarde, após a morte do rei. Terminadas as macabras execuções, que duraram todo dia, foi, por fim, incendiado o cadafalso que ardeu quase toda a noite, como se fosse um archote gigante. As nuvens negras, que se elevavam ao céu, constituíam um testemunho exemplar das horrorosas execuções.
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