domingo, 24 de janeiro de 2010

DIÁLOGOS COM ANTÓNIO SÉRGIO

A. Campos Matos pergunta:

Que representava para si a escola?

Liguei sempre pouca importância aos trabalhos escolares, a escola era para mim a sociedade dos condiscípulos. Fiz o curso secundário num internato, o Colégio Militar, depois de uma rapidíssima passagem por uma escola primária qualquer, quando regressei de Angola, onde o meu pai fora governador do Congo português. Passei ali seis anos de excelente humor. Dei-me sempre muitíssimo bem com os condiscípulos, e não tomei nada a sério a disciplina militar de estabelecimento.

Foi bem sucedido na sua actividade escolar?

Fui porque não me custava; mas muito melhor nos últimos anos, por causa da matemática e da física. Devi isto, em parte, aos meus bons condiscípulos, frequentemente me pediam explicações, o que me obrigava a saber bem o assunto. A matemática, a poesia e o desenho eram os meus encantos. Gostava muito de desenhar com o Vasco Lopes de Mendonça, cujo talento de desenhista eu admirava muitíssimo, e continuo admirando.
(...)

O objectivo da escola consistiria no seu entender...

[Em] emancipar os indivíduos, servir o progresso social; e treinar as inteligências, a fim de as tornar cada vez mais plásticas, universalistas e libertas de limitações, como exige a moderna democracia: é familiarizar a juventude com o manejo das realidades, preparando no estudante um produtor moderno, cooperador em planos de acção comum - entendendo-se por isto, quer o produtor no domínio económico quer o criador na ciência e na arte; o objectivo do ensino, em resumo, é fomentar a capacidade de um desenvolvimento contínuo, de uma racionalização intérmina da experiência, preparando os Portugueses para uma vida mais humana mais progressiva, mais fecunda, dentro de uma forma social mais justa.
(...)
Educar uma criança enviando-a à actual escola é como preparar um automobilista metendo-o no museu dos coches reais. O mestre supõe que o aluno não viverá da vida de hoje. (...) O primeiro passo do educador deveria ser determinar, tanto quanto possível, o que exige de nós concretamente a sociedade contemporânea, para sua maior felicidade, justiça e harmonia, e como o trabalho educativo poderia satisfazer tais exigências, de maneira que na escola se reproduzissem, num nível alto, os problemas da sociedade. Seguir-se-ia a este exame uma reforma do espírito escolar, segundo as concretas necessidades do desenvolvimento social.
Isabel Pinto

2 comentários:

  1. Este livro dos anos 80, em que o arquitecto Campos Matos "entra em diálogo" com António Sérgio foi uma óptima lembrança! Esta obra da Ed. Presença é uma boa forma de divuldação do pensamento de António Sérgio, que vamos recordar e homenagear na nossa escola.
    Isabel I.

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  2. António Sérgio era defensor de uma educação humanista, moderna, adaptada aos tempos de mudança.
    Gostei particularmente da parte em que diz:
    "Educar uma criança enviando-a à actual escola é como preparar um automobilista metendo-o no museu dos coches reais. O mestre supõe que o aluno não viverá da vida de hoje".
    Nós... as professoras de História da ESQM, não somos nada este tipo de mestre... Queremos preparar-vos para as grandes "corridas" da vida! Se nos desviarmos deste rumo... avisem-nos!
    Luísa Godinho

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